Quando 3I/ATLAS foi detectado a 670 milhões de km do Sol, a comunidade astronômica percebeu que estava diante de um cometa interestelar possivelmente mais antigo que o próprio Sistema Solar.
Contexto histórico dos cometas interestelares
Até o fim da década passada, apenas dois visitantes interestelares – ‘Oumuamua (2017) e o cometa 2I/Borisov (2019) – tinham causado comoção. Ambos mostraram idades compatíveis com a formação de estrelas jovens, reforçando a ideia de que a maioria dos objetos que cruzam a nossa vizinhança galáctica são relativamente recentes. No entanto, a descoberta de 3I/ATLAS sugere que o fluxo de detritos galácticos inclui vestígios de eras muito anteriores à nossa própria nebulosa solar.
Descoberta e observações iniciais
A detecção aconteceu em , pelo telescópio ATLAS, parte do projeto NASA, instalado em Río Hurtado, Chile (código W68). Na hora, o objeto exibiu magnitude aparente 18, velocidade de 61 km/s em relação ao Sol e se encontrava a 3,52 UA da Terra.
Logo após a descoberta, os dados foram enviados ao Minor Planet Center da União Astronômica Internacional, que atribuiu a designação temporária ‘A11pl3Z’ antes de confirmar a classificação como cometa interestelar número 3 da série (3I).
Observatórios de grande porte – Hubble Space Telescope, James Webb Space Telescope e o recém‑ativado Observatório SPHEREx – rapidamente direcionaram suas lentes ao alvo, confirmando a presença da coma típica de cometas e medindo traços de água congelada.
Análises dos cientistas e estimativas de idade
A pesquisa liderada por Matthew Hopkins, astrônomo da Universidade de Oxford, aplicou um modelo estatístico que relaciona a composição química, a órbita e a velocidade de entrada ao Sistema Solar. ‘Todos os cometas não interestelares, como o cometa Halley, se formaram com o nosso sistema solar, então têm até 4,5 bilhões de anos’, explicou Hopkins num comunicado à imprensa. ‘Mas os visitantes interestelares podem ser muito mais velhos. Nosso método indica que 3I/ATLAS tem, no mínimo, 7,8 bilhões de anos – quase três bilhões a mais que a Terra’.
O professor Chris Lintott, coautor do estudo e apresentador do programa da BBC ‘The Sky at Night’, reforçou a probabilidade: “Calculamos que há cerca de dois terços de chance de que esse cometa seja mais antigo que o Sistema Solar. Ele provavelmente se formou no disco espesso da Via Láctea, onde residem estrelas da primeira geração.”
Algumas simulações de rota sugerem que 3I/ATLAS pode ter passado próximo a outras estrelas antes de ser capturado pela gravidade solar. Essa trajetória altamente excêntrica explica a velocidade de 220 000 km/h que ele mantém ao atravessar nosso sistema.

Impactos para a ciência planetária
Se a idade estimada for confirmada, 3I/ATLAS será o primeiro material extraterrestre direto que nos oferece uma amostra de um período anterior à formação dos planetas terrestres. A presença de água congelada, identificada nos espectros do James Webb, indica que o cometa transporta os blocos químicos que, em outros momentos, podem ter alimentado discos protoplanetários jovens.
Além do valor geológico, a descoberta tem reflexos na modelagem da evolução galáctica. “Objetos como esse são como fósseis interestelares. Eles podem nos dizer como era a abundância de elementos leves quando a Via Láctea ainda era uma galáxia jovem”, comentou o astrofísico Abraham Loeb da Universidade de Harvard, embora tenha advertido que ideias sobre origem tecnológica foram descartadas após análises mais detalhadas.
Próximos passos e observações futuras
O cometa deve alcançar seu periélio em , a 1,36 UA do Sol – entre as órbitas de Terra e Marte. Essa janela de maior brilho permitirá observações contínuas com telescópios terrestres e espaciais, inclusive medições de gases voláteis que podem mudar conforme o cometa aquece.
Equipes de várias instituições já submeteram pedidos de tempo de observação ao Observatório Cerro Tololo e ao European Southern Observatory. Espera‑se que, até o final de 2026, haja um conjunto de dados suficiente para comparar 3I/ATLAS com os poucos cometas interestelares já estudados.
Enquanto isso, o ATLAS continuará monitorando o céu em busca de novos visitantes, reforçando a importância de redes de alerta precoce para a comunidade científica.
Perguntas Frequentes
Qual a probabilidade de 3I/ATLAS ser mais antigo que o Sistema Solar?
Os cálculos de Matthew Hopkins apontam para cerca de 66 % de chance de que a idade mínima seja 7,8 bilhões de anos, ou seja, quase três bilhões a mais que a Terra.
Quais telescópios vão observar o cometa durante o periélio?
Além do James Webb Space Telescope, o Hubble Space Telescope e observatórios terrestres como o Cerro Tololo e o European Southern Observatory já receberam pedidos de tempo de observação.
O que a composição do 3I/ATLAS pode revelar sobre a formação da Via Láctea?
A presença de água congelada e de moléculas orgânicas em um cometa tão antigo sugere que as primeiras gerações de estrelas já produziam esses compostos, indicando que os materiais que alimentaram discos protoplanetários já estavam presentes nas primeiras fases da galáxia.
Como foi feita a estimativa de idade de 7,8 bilhões de anos?
A equipe combinou análises espectroscópicas com modelos de evolução química que relacionam a proporção de voláteis a idade. O método considera a velocidade de entrada, a órbita hiperbólica e a radiação recebida ao longo de bilhões de anos.
Há risco de impacto da Terra com o 3I/ATLAS?
Nenhum. As trajetórias calculadas pelo Minor Planet Center mostram que o cometa passará a aproximadamente 0,67 UA da Terra, uma distância segura.
1 Comentários
Luis Fernando Magalhães Coutinho
É inaceitável que, diante de um marco científico tão extraordinário, ainda persistam aqueles que minimizam a importância da pesquisa espacial, como se a curiosidade humana fosse um luxo supérfluo!!! Devemos reconhecer que cada descoberta, como o cometa 3I/ATLAS, nos lembra da nossa responsabilidade coletiva de proteger o conhecimento e fomentar a educação, não de sucumbir ao apatismo institucional!!!